COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Se você tiver de escolher apenas um filme para ver na Mostra de Cinema de São Paulo, veja "O Guia Pervertido da Ideologia". Se tiver de ler apenas um livro até 2013, que seja "O Ano em que Sonhamos Perigosamente" (Boitempo, R$ 32, 144 págs.)
Os dois têm algo em comum: reúnem pensamentos e teorias do esloveno Slavoj Zizek, um dos filósofos mais importantes da atualidade.
No livro, ele analisa e esclarece o que muitos acadêmicos não conseguiram destrinchar sobre a Primavera Árabe, o movimento Occupy, os "riots" em Londres e os protestos na Grécia.
editoria de arte/folhapress
"O Nobel da Paz ter ido para a União Europeia é uma piada, mas também pode ser visto como um voto para uma ressurreição política da região", diz Zizek.
O livro caracteriza os distúrbios ingleses de 2011 não como ação de vândalos, mas como um "carnaval de destruição consumista", no qual os excluídos da sociedade tomaram objetos de desejo como tênis e relógios de grife.
Em meio a teses que misturam política e psicanálise, há citações a filmes como "Coriolano" e uma análise da série de TV "The Wire".
Esse tipo de análise é o foco de "O Guia Pervertido da Ideologia", no qual Zizek aplica suas teorias para analisar sucessos do cinema.
A diretora, Sophie Fiennes (irmã do ator Ralph Fiennes), recria cenários de "Taxi Driver", "Laranja Mecânica" e "Titanic", de modo que Zizek apareça "dentro" dos filmes.
E não é preciso concordar com as conclusões do filósofo, mas o fato é que ele dá as coordenadas para que a visão do espectador vá além do roteiro e alcance o que ele chama de discurso da ideologia, mudando totalmente a experiência de ver um filme.
"Se quisermos entender como a ideologia funciona hoje, devemos aprender a 'ler' os blockbusters de Hollywood ou fenômenos de massa como o Gangnam Style", diz Zizek, antes de destrinchar seus argumentos.
"Você pode ver uma imagem centenas de vezes, compartilhá-la, mas não precisa se envolver a ponto de levá-la a sério. É assim que muitos de nós tratam a política e a religião, como algo de que nos aproximamos, mas em que não acreditamos de fato."
É com a mesma seriedade que Zizek vai dizer que a desgraça de "Titanic" seria o desembarque feliz do casal, já que a mocinha esclarecida é na verdade um exemplo de como a classe burguesa procura na classe trabalhadora uma fonte de vitalidade.
A primeira incursão de Zizek nas telas, "O Guia Pervertido do Cinema" (2006), que segue os mesmos moldes e tem uma análise brilhante de "Os Pássaros", com o filósofo na famosa cena do barquinho, também está na mostra. Mas é mais fácil de ser encontrado, inclusive no YouTube, o que faz valer a pena ir atrás do título novo.
Zizek, que é fã de novelas e assistiu à "Escrava Isaura", sucesso na Eslovênia nos anos 1980, admite que nunca viu nenhum de seus filmes.
"A ideia de confrontar minha imagem na tela é totalmente traumática. Fico horrorizado só de pensar".
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/1175722-filosofo-slavoj-zizek-analisa-discurso-do-cinema-em-documentario.shtml
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